Só Quem Já Perdeu - Capítulo 1: O Inicío do Fim (Part.2)


Meu Silencio

Os dias seguintes no hospital foram longos e silenciosos. Eu me sentava ao lado da cama de Ji-ho enquanto as máquinas ao seu redor piscavam e emitiam sons ritmados. Meu irmão parecia estar dormindo, mas era um sono estranho, como se ele estivesse perdido em algum lugar muito distante, para onde ninguém podia alcançá-lo.

Minha mãe não saía do quarto. Ela sussurrava para ele, contava histórias e cantava canções de ninar como se ele ainda fosse um bebê. De vez em quando, sua voz tremia, e ela segurava o choro, mas era inútil. Eu ouvia seus soluços mesmo quando ela tentava escondê-los.

Meu pai dividia o tempo entre o hospital e o trabalho. Ele dizia que precisava continuar, que havia contas a pagar. Eu o ouvia falar com a médica em voz baixa, perguntando sobre os custos e os tratamentos. Mas, quando ele entrava no quarto, tentava parecer forte.

— Ji-yeon, quer comer algo? — ele perguntou uma vez, mas eu balancei a cabeça.

Eu não queria comer. Não queria dormir. Só queria que Ji-ho abrisse os olhos e começasse a rir como antes, zombando de mim por algo bobo, como ele sempre fazia.

Mas ele não ria.

Foi no quarto dia que minha mãe finalmente notou meu silêncio.

— Ji-yeon, você não falou nada desde... — Ela parou, como se a palavra "acidente" fosse pesada demais para ser dita. — Você está bem, minha filha?

Eu queria dizer que não. Que eu sentia como se um nó gigante estivesse preso na minha garganta, impedindo-me de respirar direito. Mas apenas balancei a cabeça, e ela me puxou para um abraço apertado.

— Está tudo bem, meu amor... Mamãe está aqui. Você está segura... Está tudo bem... — Ela repetia, mas sua voz tremia tanto que não soava verdadeira.

No fundo, eu sabia que nada estava bem.

No dia seguinte, um psicólogo veio falar comigo. Ele era gentil e tinha um sorriso calmo, mas seus olhos pareciam tão tristes quanto os de minha mãe.

— Ji-yeon, eu sou o doutor Lee. Você pode me chamar de tio Lee, se quiser. Quero conversar com você, pode ser?

Eu olhei para ele, mas não respondi. Apenas peguei o urso de pelúcia que meu pai havia trazido para mim e o apertei contra o peito.

— Não tem problema, podemos só ficar sentados aqui. — Ele se sentou no chão ao meu lado, sem dizer mais nada.

Por algum motivo, isso me fez sentir um pouco menos sufocada.

Naquela noite, minha mãe tentou me convencer a voltar para casa com meu pai, mas eu recusei. Não queria deixar Ji-ho sozinho.

— Tudo bem, então ficamos todos aqui — ela disse, ajeitando os cobertores na pequena cama improvisada ao lado do meu irmão.

Mas mesmo cercada pelos dois, eu nunca me senti tão sozinha.

Quando entrei no quarto sozinha, dias depois, foi assustador. As máquinas pareciam mais altas, e o silêncio ao redor de Ji-ho era esmagador. Olhei para ele, esperando algum sinal, qualquer movimento, mas ele permaneceu imóvel.

— Ji-ho... — tentei sussurrar, mas minha voz não saiu.

Então, sentei-me ao lado dele e segurei sua mão. Era pequena e fria. Fiquei assim por horas, até minha mãe aparecer e me encontrar dormindo ali, com a cabeça apoiada na cama.

— Ele vai melhorar, Ji-yeon... — ela murmurou, mas seu olhar dizia outra coisa.

E foi assim que minha família começou a mudar.

Os dias viraram semanas, e as semanas se transformaram em meses. O hospital se tornou nosso novo lar. Minha mãe não dava mais aulas, preferindo passar todo o tempo ao lado de Ji-ho. Eu a via segurar sua mão pequena, murmurando palavras de encorajamento como se ele pudesse ouvi-la.

— Você vai voltar para nós, meu filho. Vai, sim.

Meu pai tentava equilibrar tudo. Trabalhava durante o dia e passava noites no hospital. Às vezes, ele se sentava ao lado de Ji-ho, com os olhos fechados, parecendo buscar forças em silêncio. Outras vezes, eu o encontrava olhando para minha mãe, preocupado.

— Mi-ran, precisamos conversar — ouvi meu pai dizer uma noite, enquanto eu fingia dormir no sofá do quarto improvisado.

— Não agora, Dong-wook — minha mãe respondeu, sem tirar os olhos de Ji-ho.

— Mi-ran... nós precisamos falar sobre o futuro.

— Ji-ho é o nosso futuro! — ela rebateu, quase em um grito abafado.

Ele suspirou, passando a mão pelos cabelos.

— Não estou dizendo para desistir dele. Nunca faria isso. Mas as contas estão se acumulando, e o dinheiro está acabando. Precisamos pensar em como vamos lidar com isso.

Minha mãe ficou em silêncio por um longo momento antes de murmurar:

— Eu não posso deixá-lo. Se eu sair daqui, ele pode acordar e não me ver... ele pode...

Ela não terminou a frase, mas percebi que estava chorando.

Na escola, tudo parecia um borrão para mim. As risadas dos colegas soavam distantes, como se viessem de outro mundo. Eu me sentia fora de lugar, como se não pertencesse mais àquele ambiente.

— Ela não fala mais — ouvi uma menina cochichar para outra, e aquilo me atingiu como um soco.

Eu sabia que estava mudada, mas não sabia como voltar a ser quem eu era antes.

Os médicos visitavam Ji-ho regularmente, trazendo gráficos e termos médicos que eu não entendia. Mas as palavras “estabilidade crítica” e “falência progressiva” começaram a aparecer com mais frequência.

Uma tarde, o Dr. Kim chamou meus pais para uma conversa particular. Eles saíram do quarto, deixando-me com Ji-ho.

— Está tudo bem, oppa? — perguntei baixinho, mesmo sabendo que ele não podia me responder. Segurei sua mão fria e frágil, desejando que ele apertasse a minha de volta.

Quando meus pais voltaram, minha mãe estava pálida.

— Ji-yeon, querida, vamos para casa esta noite, está bem? — meu pai disse com um sorriso forçado.

Eu sabia que algo estava errado, mas assenti em silêncio.

O Acordar de Ji-ho
A noite em casa estava estranha. O silêncio, antes reconfortante, agora parecia sufocar. O peso das palavras do médico ainda pesava no ar, como uma nuvem escura. Minha mãe, no hospital, ainda estava lá com Ji-ho, lutando contra a dor de vê-lo tão fraco, mas mantendo a esperança acesa, por mais tênue que fosse. Meu pai e eu, voltamos para casa. A rotina, que antes parecia tão natural, agora estava partida. O que fazer quando a esperança que se tinha era uma mentira suave, forçada pela dor do coração?

Eu me sentava em silêncio no sofá, olhando para o relógio. O tempo parecia dilatado, como se o tic-tac das horas não fosse mais real. Meu pai andava de um lado para o outro na sala, como se tentasse encontrar algo em que se agarrar. Ele não sabia como se manter em pé, mas se forçava. Ele estava sempre assim, forte por fora, mas quebrado por dentro, como uma máscara que nunca caía.

O telefone tocou, e o coração de meu pai deu um pulo. Ele olhou para mim, os olhos desesperados, antes de correr para atender. No momento em que ele pegou o telefone, o mundo se apagou por um segundo. Eu vi o movimento de seus lábios, a expressão de surpresa e uma tensão crescente em seu rosto, mas não consegui entender o que estava acontecendo.

— Ji-ho… acordou. — Ele não sabia se chorava ou ria, mas a notícia foi recebida como um balde de água fria, cheia de uma esperança desesperada.

A minha mente tentou processar, mas nada parecia real. Ji-ho… meu irmão… acordado? Eu queria acreditar, queria correr de volta para o hospital, abraçá-lo, dizer que tudo ficaria bem, mas havia algo frio naquelas palavras, como um eco vazio que me atingia sem piedade. Era como se a vida me desse um estalo e me forçasse a encarar uma verdade que, até aquele momento, eu não queria aceitar.

Minha mente estava uma bagunça, os pensamentos se atropelando uns aos outros, mas meu pai já estava pegando as chaves, apressado. Não houve mais palavras, só um movimento apressado para sair, para voltar para o hospital, para ver se ele estava realmente ali, respirando, com os olhos abertos.

Chegamos ao hospital em poucos minutos, mas parecia que o tempo havia dobrado. Eu vi minha mãe, sentada ao lado de Ji-ho, segurando sua mão. Ele estava fraco, pálido, mas os olhos estavam lá. Não estava perdido como antes, ele estava ali, ele estava voltando para nós. O alívio de vê-lo… foi como um alívio de respirar depois de tanto tempo submerso. Ele ainda parecia pequeno, tão jovem, tão frágil. Sua respiração era fraca, mas ele estava respirando, e isso parecia um milagre.

Ji-ho olhou para nós e sorriu, o mesmo sorriso travesso que eu tanto lembrava. Ele tentou rir, mas a tosse veio em seguida, e ele ficou sem fôlego. Mas as palavras dele… as palavras dele eram esperançadoras, e a criança que eu conhecia, a que costumava zombar de mim e fazer piadinhas, estava ali, de volta.

— Eu sabia que ia voltar… — Ele disse, com aquele sorriso, como se tudo fosse fácil. Como se tudo pudesse voltar a ser como antes.

Eu queria acreditar, queria tão desesperadamente acreditar, mas o medo, esse medo que se instalou em mim, me fazia hesitar. Algo não estava certo. O ar parecia espesso, a sensação era estranha. Meu pai estava sorrindo, mas seus olhos estavam turvos, cheios de algo que eu não conseguia identificar.

Ele disse palavras de apoio, tentando ser o pilar da família. A esperança ainda estava ali, mas havia um peso em cada palavra.

O médico apareceu. Ele fez uma breve pausa na porta, olhou para Ji-ho e então, com uma expressão que eu já sabia que não era boa, chamou meu pai para uma conversa privada. Eu queria ouvir, queria entender o que estava acontecendo, mas me senti desconectada de tudo. Os meus pés estavam no chão, mas minha mente estava longe.

Meu pai voltou, com o rosto pálido, chamou minha mãe e as palavras saíram dele como se fossem jogadas, sem vida, sem emoção.

— O médico disse que a situação dele… não é boa.

Eu vi meu pai chorando muito naquela hora com minha mãe. Nao sabia direito o que ele estava falando pra ela, mas sabia que nao era coisa boa. Meu pai fico ali falando com ela e eu com Ji-ho segurando sua mão, mas sem dizer nada so estava feliz em velo acordado. 

— A maioria dos pacientes que acordam depois de um coma profundo… morrem em poucas horas. O corpo não consegue mais sustentar. O medico disse que é para ficarmos com ele e aproveitarmos o pouco tempo que temos juntos. Isso é um milagre pra gente. 

Eu olhei para Ji-ho, ele estava ali, ainda sorrindo, mas o sorriso estava começando a desvanecer. Eu não entendi, não queria entender. Eu só queria gritar. Meu pai me chamou pra conversar e me contou o que poderia acontecer. Eu queria dizer que ele ainda ia voltar, que ele ia ser o Ji-ho de antes. Mas as coisas não seriam assim.

O médico havia dado sua previsão, e agora estávamos esperando, esperando um milagre, esperando um pedaço de tempo que parecia escorrer entre os nossos dedos.

O hospital estava quieto, exceto pelo som constante das máquinas e o zumbido suave do oxigênio fluindo. O ambiente era pesado, e a sala de Ji-ho, que antes estava cheia de esperanças, agora parecia estar envolta em uma aura de despedida. A luz suave da tarde filtrava pelas janelas, iluminando a cama onde Ji-ho estava, tão frágil e pequeno, mas ainda com aquele sorriso tímido nos lábios. Eu estava lá, em pé ao lado dele, sem saber o que fazer. Não podia falar, mas eu estava ali, observando cada movimento dele, cada respiração, cada gesto.

Minha mãe estava ao lado dele, segurando sua mão com força, como se temesse que, se soltasse, ele fosse embora. Seu rosto estava pálido, mas seus olhos, apesar da tristeza, estavam focados nele, como se estivesse tentando gravar cada segundo que lhe restava. Ji-ho, com dificuldade, virou a cabeça e me olhou. Ele tentou sorrir, mas o esforço foi grande demais. A fraqueza era visível em cada movimento, mas ele ainda era o meu irmão, o Ji-ho que eu sempre conhecera, com sua energia que parecia nunca acabar.

— Ji-yeon... — Ele sussurrou, mas não conseguiu terminar a frase.

Eu não sabia o que fazer. A dor no meu peito era imensa, mas as palavras ainda não vinham. O silêncio me cercava, como sempre fez, e eu apenas segurei seu braço com mais força, sem saber se ele sentia ou não.

Minha mãe, com a voz rouca, levantou-se da cadeira ao lado da cama e foi até a mesa onde ele guardava seus brinquedos. Com calma, ela pegou a espada que ele tanto amava, uma espada de brinquedo, mas que para ele sempre teve um valor especial, e a entregou a ele. Ji-ho, com a força que ainda restava em seus braços, segurou a espada com uma das mãos, apertando-a contra o peito. Foi como se o objeto fosse sua última conexão com o mundo, como se fosse a única coisa que ele ainda quisesse ter consigo. Ele sorriu, mas o sorriso estava mais fraco, mais distante. Eu podia ver que ele estava lutando contra o cansaço, contra a dor.

— Ji-yeon... — Ele repetiu, mas desta vez a voz dele estava mais fraca. — Por que você está tão quieta?

Eu o olhei por um momento, as palavras se prendendo na garganta. Não consegui dizer nada, mas movi a cabeça lentamente, dando-lhe o sorriso mais sincero que pude. Não sabia como explicar o que estava acontecendo dentro de mim, não sabia como transmitir a ele tudo o que eu sentia sem palavras. Apenas sorri, tentando mostrar que eu estava ali, ao seu lado, que ele não estava sozinho.

E então, depois de um momento em que o silêncio parecia engolir tudo, eu consegui dizer, com toda a força que restava em mim:

— Ji-ho.

Os olhos de meus pais se arregalaram, como se, ao ouvir minha voz pela primeira vez em um ano, algo tivesse sido quebrado. Era como se, de alguma forma, aquela palavra fosse o que faltava, como se ela fosse a chave para abrir um portão que esteve trancado por tanto tempo. Meu pai olhou para mim com os olhos marejados, e minha mãe, com a voz embargada, sorriu como se a dor tivesse diminuído, mesmo que por um instante.

Ji-ho, ao me ouvir, sorriu de volta. Era um sorriso cansado, mas um sorriso sincero. Ele parecia feliz, e naquele momento, naquele pequeno milagre, todos nós acreditamos, por um segundo, que talvez tudo fosse melhorar. Mas então, ele fechou os olhos, como se o peso da vida tivesse sido demais para ele. Ele olhou para os pais, tentando manter-se forte, mas seu corpo já não tinha forças.

— Estou com muito sono... — Ele disse, quase em um sussurro. — Estou cansado.
 
Meus pais já sabiam o que estava acontecendo. O médico já havia explicado, mas ouvir aquelas palavras dele, sentir que ele estava começando a se despedir, ainda assim cortou seus corações. Minha mãe ficou ali, com a mão sobre a dele, apertando com mais força, tentando, de alguma forma, segurar o tempo. Meu pai, com a expressão vazia, ficou ao lado da cama, olhando para o filho, sabendo que esse momento não poderia durar muito mais.


A respiração de Ji-ho ficou mais lenta, mais difícil, mas ele ainda estava ali, com a espada em uma mão e com a outra mão delicadamente segurando a mão de nossa mãe. Ele foi ficando cada vez mais fraco, e aos poucos, o sono o levou. Foi uma transição silenciosa, como se a vida estivesse se retirando dele pouco a pouco.

Quando ele finalmente se foi, foi como se o mundo tivesse dado uma pausa. Eu estava lá, segurando sua mão, e senti o último aperto. Aquele último aperto de uma vida que estava se despedindo. E então, ele sumiu completamente, como se o peso da ausência fosse tão grande que não havia mais espaço para ele no mundo.

Minha mãe não gritou. Ela não fez nenhum som. Ela simplesmente ficou ali, imóvel, com o rosto pálido e os olhos vazios. Ela não podia mais acreditar no que estava acontecendo. O homem que a apoiava, meu pai, estava de joelhos ao lado da cama, as mãos tremendo, mas ele não chorava. Ele não podia, não conseguia. O que restava de nós ali não eram mais os mesmos.

A única coisa que restou foi o silêncio. O silêncio absoluto de uma dor que não podia ser mais expressa em palavras.

Agora, tudo estava acabado.

O enterro foi um borrão de rostos, de palavras que não conseguia entender. As pessoas vinham e iam, mas nada parecia real. Eu estava vazia, como um recipiente sem vida. As palavras de consolo soavam tão distantes que parecia que as estavam dizendo para alguém que não existia mais.

Em casa, os papéis do hospital estavam sobre a mesa, como um lembrete imenso do que tínhamos perdido. As contas eram um número esmagador, algo incompreensível, como um peso que nunca poderia ser levantado. Eu olhei para meu pai, que estava deitado no sofá, com a expressão vazia de quem havia perdido a guerra. A casa estava silenciosa, sem vida.

O que restava de nós?

Tudo estava destruído. As contas, os papéis, a casa hipotecada. Minha mãe, com os olhos vazios, parecia não perceber nada. Ela não falava, não se movia, como se o peso da perda tivesse apagado qualquer vestígio de vida dentro dela.

E então, um dia, minha mãe me levou para passear. Ela comprou tudo o que eu queria, fez as coisas que costumávamos fazer juntos, mas havia algo desconectado em tudo. Era como se ela estivesse tentando encontrar uma maneira de preencher o vazio, de tentar se convencer de que ainda havia algo para amar.

Mas a verdade era que a casa estava vazia, o ar estava denso, e em algum lugar, em algum ponto de nossa existência, o fogo estava prestes a começar.


Gostou deste capítulo? 

A história de Ji-yeon continua cheia de reviravoltas e emoções nos próximos capítulos. Se você não quer esperar pelos posts diários, o livro completo "Só Quem Já Perdeu - Infância Perdida" já está disponível!

📖 Leia a história completa agora mesmo na Hotmart:
👉 Só Quem Já Perdeu - O Caminho da Cura(EM BREVE)

🌟 Não perca a oportunidade de se emocionar com cada página e descobrir todos os segredos desta história incrível!

❤️ Compartilhe com quem você sabe que vai adorar esta jornada.

Comentários