Só Quem Já Perdeu - Capítulo 5: O Tempo que Cura

Os dias seguintes foram uma mistura de alívio e reconstrução. Minha tia, sempre protetora, foi até a escola para tratar da situação do bullying que eu vinha sofrendo. Quando explicou o que havia acontecido e apresentou as evidências, a diretora, que parecia inicialmente relutante, não teve escolha a não ser agir.

As garotas que haviam me perseguido foram chamadas na frente de seus pais. Algumas choraram, outras tentaram justificar suas atitudes, mas nada podia apagar o que haviam feito. A escola, determinada a manter uma boa imagem, aplicou punições exemplares. Elas foram suspensas, e suas ações ficaram registradas em seus históricos escolares.

Minha tia, ao voltarmos para casa, comentou algo que ficou gravado em minha mente:
— Bullying não é algo incomum na Coreia, Ji-yeon. Infelizmente, algumas escolas preferem ignorar até que algo mais sério aconteça. Mas não comigo por perto. — Sua voz tinha um tom firme, quase feroz. — Ninguém vai fazer você se sentir assim novamente.

Apesar de tudo, a sensação de alívio tomou conta de mim nos dias que se seguiram. A escola parecia menos opressiva, e, pela primeira vez, eu comecei a caminhar pelos corredores sem olhar para baixo.

Com o tempo, o peso da solidão diminuiu. Ainda havia dias difíceis, mas momentos de felicidade começaram a surgir de forma inesperada. Um desses momentos foi no meu aniversário. Eu não esperava comemorações. Na verdade, sequer lembrei da data até que fui surpreendida ao chegar em casa.

Soo-min e Hyun-woo estavam na sala, com sorrisos travessos no rosto. Quando entrei, as luzes se apagaram, e eles apareceram com um bolo simples, cantando uma versão desajeitada de "Parabéns".

— Vocês... — comecei, sem saber o que dizer, enquanto segurava as lágrimas.

— Não ia deixar você passar seu aniversário sem um bolo, boba — disse Soo-min, piscando para mim.


Minha avó também estava lá, o que foi uma surpresa. Ela se aproximou com um pequeno embrulho. Ao abrir, vi um par de brincos de pérola junto com uma linda pulseira, algo simples, mas com um valor que parecia incalculável.

— Estes eram da sua mãe — explicou minha avó, sua voz carregada de emoção. — Quero que você os tenha agora.

Aquela foi uma noite em que, por algumas horas, tudo parecia perfeito. Eu ri, chorei, e, por um momento, me senti parte de algo maior novamente.

Os meses passaram, e, antes que percebêssemos, um novo ano começou. Agora, eu estava no meu último ano do ensino médio, mergulhada nos estudos. Eu tinha um sonho, um objetivo claro: ser médica.

Passei boa parte da minha infância em hospitais, tanto ao lado de Ji-ho quanto por causa do meu próprio estado emocional após os acontecimentos. Observava médicos e enfermeiros com admiração, desejando, em segredo, ser capaz de ajudar pessoas da mesma forma que eles ajudaram nossa família.

A rotina era exaustiva, mas eu me dedicava com tudo o que tinha. Soo-min e Hyun-woo frequentemente apareciam para me ajudar, cada um à sua maneira.

— Você vai acabar ficando com um cabeção de tanto estudar — provocava Soo-min, enquanto eu ria, sem tirar os olhos dos livros.

Minha tia, por outro lado, não perdia uma oportunidade de me elogiar.

— Olhe para você, Ji-yeon. Cresceu tão bonita e inteligente. Sua mãe teria tanto orgulho.

Essas palavras me aqueciam, mas também traziam um misto de saudade e nostalgia.

Com o tempo, percebi que as pessoas à minha volta também mudavam. Hyun-woo, por exemplo, começou a aparecer mais frequentemente para me ajudar com os estudos, mesmo quando eu não pedia. Ele era paciente, calmo, e sempre sabia como explicar as coisas de maneira clara.

— Assim, veja — disse ele um dia, puxando um caderno. — Se você visualizar o processo dessa forma, a fórmula faz mais sentido.

Ele estava tão perto que podia sentir seu perfume discreto. Por um momento, senti meu coração acelerar, mas afastei o pensamento rapidamente. Ele era só um amigo... não era?

Já Soo-min, por outro lado, parecia mais desajeitado ultimamente. Sempre que minha tia elogiava minha aparência, ele desviava o olhar, as orelhas ficando levemente vermelhas.

— Nossa Ji-yeon está se tornando uma mulher muito bonita, não acha, Soo-min? — dizia minha tia, rindo da expressão desconfortável dele.

— Eu... é, acho que sim — murmurava ele, sem jeito, enquanto tentava mudar de assunto.

Eu sabia que algo estava mudando, mas não conseguia entender exatamente o quê. Talvez fosse só o tempo passando. Talvez fosse apenas a vida, com suas surpresas e reviravoltas, mostrando que, mesmo após tanto sofrimento, a felicidade ainda era possível.

E, mesmo sem perceber, comecei a sonhar novamente. Sonhar com o futuro, com a possibilidade de ser médica, com uma vida onde pudesse encontrar meu lugar no mundo. Mal sabia eu que as reviravoltas estavam longe de terminar.

Minha rotina escolar era intensa, mas também solitária na maior parte do tempo. Apesar das coisas terem melhorado após os acontecimentos do ano anterior, eu mantinha minha cabeça baixa e me concentrava nos estudos. A escola onde eu estava era conhecida por sua competitividade acadêmica, e os alunos viviam em um ambiente de constante pressão.

As aulas eram longas, os professores exigentes, e os colegas... bem, muitos deles estavam tão focados em suas próprias metas que a interação era mínima. Isso me servia bem. Eu preferia o silêncio ao invés de arriscar novos vínculos que poderiam me ferir.

Ainda assim, às vezes, eu notava olhares curiosos, como se algumas pessoas tentassem entender quem eu era. Um desses olhares, em particular, começou a se destacar.

Ele era de outra sala, alto, com cabelos bem penteados e óculos que lhe davam um ar inteligente. Eu não sabia o nome dele, mas percebia que ele cruzava propositalmente os corredores no mesmo horário que eu, ou aparecia no refeitório nos dias em que eu decidia comer ali. Nunca trocamos palavras, mas eu sentia sua presença, como uma constante.

Naquela sexta-feira, a biblioteca estava tranquila, como sempre. Era meu refúgio favorito, um lugar onde eu podia mergulhar nos livros sem ser perturbada. Estava sentada em uma mesa perto da janela, revisando minhas anotações de biologia enquanto esperava Soo-min e Hyun-woo.

O barulho da cadeira sendo puxada me tirou da concentração. Levantei os olhos, surpresa, e lá estava ele. O rapaz que eu havia notado tantas vezes. Ele segurava um livro grosso de química em uma das mãos e sorria de forma amistosa.

— Posso me sentar aqui? — perguntou, apontando para a cadeira vazia à minha frente.

Assenti com um movimento pequeno, sem dizer nada. Meu coração acelerou um pouco, mas mantive a calma, voltando os olhos para o meu caderno.

— Você parece estar bem concentrada — ele disse, tentando puxar conversa. — Está estudando biologia?

— Sim — respondi, a voz quase um sussurro.

Ele sorriu mais uma vez e colocou o livro na mesa.
— Sou Park Jae-hyun, da sala 3-C. E você?

Hesitei antes de responder.
— Han Ji-yeon... 3-A.

— Ah, eu já tinha te visto por aqui. Sempre tão focada. — Ele parecia genuinamente interessado, o que me deixou desconfortável, mas também um pouco intrigada.

— É um ano importante — murmurei, sem olhar diretamente para ele.

Jae-hyun riu baixo.
— Isso é verdade. Você está se preparando para o exame de admissão da faculdade?


— Quero ser médica — respondi, ainda sem muita expressão, mas percebendo que ele não parecia se intimidar com minhas respostas curtas.

Ele começou a falar sobre como também estava estudando muito, já que queria cursar engenharia. Eu escutava em silêncio, respondendo de vez em quando com acenos ou palavras curtas. A presença dele era gentil, mas eu estava tão acostumada a erguer muros ao meu redor que não sabia como agir.

Quando a porta da biblioteca se abriu, reconheci as vozes de Soo-min e Hyun-woo antes mesmo de vê-los. Soo-min foi o primeiro a aparecer, com seu sorriso típico e um pacote de snacks na mão. Hyun-woo vinha logo atrás, carregando um livro grosso de matemática.

— Ji-yeon, você já começou sem a gente? — brincou Soo-min, mas a alegria em seu rosto desapareceu no momento em que viu Jae-hyun sentado à minha frente.

Hyun-woo parou ao lado de Soo-min, olhando para Jae-hyun com uma expressão neutra, mas claramente avaliadora.
— Quem é ele? — perguntou Soo-min diretamente, sem sequer tentar disfarçar a curiosidade.

— Park Jae-hyun — respondeu o rapaz, levantando-se e estendendo a mão, como se quisesse amenizar a tensão no ar. — Sou colega de escola da Ji-yeon.

Soo-min não apertou a mão dele. Apenas lançou um olhar significativo para mim, como se esperasse uma explicação.
— Ele só estava conversando — disse, quase em um sussurro, sentindo o peso da atenção dos três sobre mim.

Hyun-woo deu um passo à frente, pousando seu livro na mesa.
— Bom, acho que a Ji-yeon já tem ajuda suficiente para estudar.

Jae-hyun, percebendo o clima, pegou seu livro e se despediu com um sorriso.
— Foi um prazer conversar com você, Ji-yeon. Espero que a gente se encontre de novo.

Ele saiu, deixando um silêncio desconfortável na mesa. Soo-min soltou um suspiro audível, sentando-se na cadeira onde Jae-hyun estava antes.

— De onde ele surgiu? — murmurou, quase para si mesmo.

Hyun-woo começou a organizar os materiais na mesa, como se tentasse ignorar o que havia acontecido, mas percebi que ele estava incomodado.

Tentei voltar ao estudo, mas a tensão entre nós era palpável. Soo-min e Hyun-woo estavam estranhamente calados, e, por mais que não quisessem admitir, era óbvio que a chegada de Jae-hyun havia mexido com eles.

Eu não sabia como lidar com isso. Eles sempre foram a base do meu mundo, mas, naquele momento, percebi que talvez estivéssemos entrando em uma nova dinâmica. Uma que eu ainda não entendia completamente.

O clima na mesa da biblioteca estava estranho, e eu sentia cada olhar direcionado a mim, mesmo que nenhum deles dissesse nada diretamente. Tentei me concentrar nas anotações, mas minha mente estava presa ao que tinha acabado de acontecer. O que Jae-hyun queria comigo? Por que Soo-min e Hyun-woo estavam agindo daquele jeito?

Hyun-woo, sempre calmo, abriu o livro de matemática e começou a folhear em silêncio, mas suas sobrancelhas franzidas mostravam que ele estava longe de se concentrar no conteúdo. Soo-min, por outro lado, estava inquieto, batucando os dedos na mesa. Finalmente, ele quebrou o silêncio:

— Você já conhecia ele? Esse... Jae-hyun?

Levantei os olhos, surpresa com o tom de sua voz. Ele não estava brincando como de costume; havia algo mais ali, uma ponta de irritação que ele não conseguia disfarçar.
— Não muito — respondi, tentando parecer indiferente. — Só o vi algumas vezes pelos corredores.

Soo-min soltou uma risada curta, claramente forçada.
— E de repente ele decide puxar assunto com você na biblioteca. Coincidência, né?

Hyun-woo finalmente ergueu o olhar do livro, encarando Soo-min.
— Qual é o problema? Ele só conversou com ela.

Soo-min bufou, cruzando os braços.

— O problema é que a Ji-yeon não precisa de gente estranha se aproximando dela.

— Gente estranha? — rebati, minha voz um pouco mais firme do que esperava. — Ele só foi educado, Soo-min.

Hyun-woo soltou um suspiro, como se quisesse encerrar o assunto.
— Talvez devêssemos nos concentrar no que viemos fazer aqui: estudar.

Soo-min não respondeu, mas ficou em silêncio, o que já era um alívio. Tentamos voltar ao ritmo, mas a tensão continuava no ar.

Naquela noite, quando já estávamos em casa, Soo-min não conseguiu segurar o que estava pensando. Enquanto eu revisava algumas anotações na mesa da sala, ele apareceu, se apoiando no batente da porta.

— Você sabe que só estou tentando te proteger, né?

Levantei os olhos, confusa.
— Proteger de quê, Soo-min?

Ele suspirou, passando a mão pelos cabelos.
— De pessoas que podem não ser tão boas quanto parecem. A gente não sabe nada sobre esse Jae-hyun. Ele pode estar se aproveitando de você.

A ideia era absurda, mas ao mesmo tempo, o tom sério em sua voz me fez hesitar. Soo-min sempre foi protetor, às vezes até demais, mas nunca falou assim antes.

— Eu sei me cuidar — respondi, com mais convicção do que sentia de verdade.

— É, eu sei — ele murmurou, mas não parecia convencido. Antes de sair, ele acrescentou: — Só... toma cuidado, tá?

Fiquei ali, olhando para a porta vazia, tentando entender o que realmente estava acontecendo. Seria mesmo preocupação, ou havia algo mais por trás disso?

Os dias seguintes passaram lentamente. Na escola, Jae-hyun tentou se aproximar mais uma vez, mas mantive a distância.

Algo nos conselhos de Soo-min ecoava na minha mente, e eu não sabia se deveria dar abertura para alguém novo no meu mundo.

Na sexta-feira seguinte, quando fui para a biblioteca novamente, Soo-min e Hyun-woo chegaram mais cedo do que o normal. Era quase como se quisessem evitar que Jae-hyun tivesse outra chance de conversar comigo. Eles estavam agindo de forma exagerada, e isso me incomodava.

Eles se sentaram e começaram a se comunicar, mas algo parecia fora de lugar. Quando Hyun-woo começou a explicar um exercício de química, seu olhar cruzou com o meu de uma forma que me fez perder o foco por um momento. Ele parecia tão próximo, mas eu não conseguia entender o que ele queria. Ou o que eu queria dele.

— Você está distraída hoje — ele comentou, com um leve sorriso.

Eu respirei fundo, tentando me recompor, mas, no fundo, eu sabia que ele estava certo. Algo dentro de mim estava inquieto.

Enquanto estudávamos, Hyun-woo se inclinou para me ajudar com um exercício. Ele explicou pacientemente, sua voz calma e baixa. Quando terminei o problema, ele sorriu.
— Viu? Você já sabia a resposta, só precisava de um empurrão.

Soo-min, que até então estava quieto, de repente falou algo.

— Eu vou pegar um café. Você quer? — ele perguntou, com aquele jeito protetor que eu tanto conhecia.

Eu só acenei com a cabeça, mas, antes que pudesse dizer qualquer coisa, ele já estava saindo. Fiquei sozinha com Hyun-woo por alguns segundos.

— Ji-yeon — ele disse, sua voz baixa, quase tímida. — Eu sei que você está passando por muita coisa, mas eu queria... queria que você soubesse que, se precisar de alguém para conversar, estou aqui.

Eu me senti um pouco vulnerável com suas palavras, como se estivesse sendo desarmada, mas, ao mesmo tempo, havia algo reconfortante na sinceridade dele. Não sabia como reagir.

Fui interrompida por Soo-min voltando com o café, e o olhar entre ele e Hyun-woo foi rápido, mas perceptível.

Algo estava acontecendo, e eu não sabia como lidar com isso.

Eu me perdi em meus pensamentos, tentando processar tudo o que estava acontecendo, enquanto as horas passavam. Cada palavra de Hyun-woo e cada gesto de Soo-min me deixavam mais confusa. Eu não queria pensar demais nisso, não queria deixar que isso interferisse na amizade que sempre tivemos, mas a verdade era que algo estava mudando.

Eu só não sabia o que fazer com isso.

Naquela noite, antes de dormir, uma dúvida permaneceu em minha mente. Eles sempre estiveram ao meu lado, mas e se, agora, o motivo não fosse mais apenas amizade? Essa possibilidade me assustava. Eu não sabia lidar com sentimentos tão confusos, especialmente quando o que eu mais desejava era que as coisas continuassem como antes.


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